sábado, 13 de novembro de 2010

A COBRA CASOU COM O PORCO ESPINHO E TEVE 12 ROLOS DE ARAME FARPADO. Contribuições Étnicas para a Formação da Cultura Brasileira


Francisco Canindé Tinoco de Luna*



Ethos é a imagem que alguém faz de si mesmo. Logo, o grupo de pessoas que se vê com imagem semelhante constitui uma etnia. A contribuição étnica para a formação da cultura brasileira veio da participação de três grandes correntes humanas: brancos de origem européia, especialmente portugueses, negros africanos que vieram obrigados para exercer o trabalho escravo e os índios que aqui estavam no tempo das descobertas. Dessa mistura de etnias nasceu uma das culturas e uma das nações mais diversas e mais interessantes do planeta: o Brasil.
Em princípio, convém ressaltar que a visão tradicional acerca da contribuição das etnias para a cultura de nosso país foi, durante séculos, uma visão preconceituosa e equivocada; chegou-se ao cúmulo de afirmar que o Brasil nunca ia se desenvolver porque as “raças” que tinham formado o nosso povo eram inferiores: o português pouco inteligente e covarde, o negro supersticioso e truculento e o índio preguiçoso e canibal.
A moderna antropologia, no entanto, prova que não pode haver maior equívoco e maior injustiça do que admitir esses absurdos. Na verdade, até mesmo a palavra “raça” foi muito mal empregada por longo tempo; não existe, antropologicamente, diferentes raças entre os homens: o ser humano constitui uma raça só e a diferença de cor nada tem a ver com inteligência, intelecto ou aptidão para qualquer habilidade.
Vamos, no presente trabalho, descrever e analisar um pouco acerca da contribuição desses três importantes elementos humanos na formação da cultura brasileira. O índio que aqui estava no tempo das grandes descobertas, apesar de algumas práticas estranhas ao ideário cristão dos descobridores, tais como a poligamia, o canibalismo e andar nus, deixou heranças importantes que hoje estão impregnadas na cultura brasileira, dentre as quais podemos destacar: o costume do banho diário, a culinária e uma série de termos que foram incorporados ao português brasileiro. Além disso, o ideal de liberdade, característica marcante da brasilidade, certamente é herança dos índios. Lembremos que os povos indígenas, nunca aceitaram a escravidão, fizeram até uma guerra chamada Confederação dos Tamoios para evitá-la e, por isso, obrigaram os portugueses a ter que ir buscar escravos na longínqua África. Interessante acerca dos índios era a tolerância deles para com a questão do homossexualismo. Entre os indígenas, o homossexual era não só respeitado como venerado, era considerado um ser místico e sensitivo que geralmente exercia a função de profeta, conselheiro e de líder espiritual.
Os negros, etnia que foi violentamente arrastada para nosso país para sofrer os horrores da escravidão, tem uma das mais importantes contribuições para nossa cultura. Além da violência física, os negros também sofreram a violência intelectual. Os padres, a serviço de Portugal, procuravam convencê-los de que a escravidão tinha sido uma coisa boa para eles: ao sair da África, eles estavam sendo escolhidos pelo Deus verdadeiro para vir conhecer o cristianismo e os maus tratos pelos quais passavam na escravidão não passavam de uma caridade que os portugueses estavam lhes fazendo para que eles pagassem seus pecados e pudessem se salva, diziam. A contribuição do negro hoje pode ser notada na música e nas danças, mas o grande legado deixado por eles foi a alegria marcante que caracteriza o povo brasileiro.
O branco, elemento invasor e responsável pelo massacre contra os índios e pelas atrocidades contra os negros, também deixou uma contribuição fundamental para a nossa cultura. A língua que falamos, a religião cristã, a organização política e o sistema econômico que o Brasil adotou seguiu a influência portuguesa. Fazendo justiça, é bom que se diga que o português, nem de longe é esse tolo que ainda hoje serve de motivo para muitas piadas e filmes de comédia; segundo Napoleão Bonaparte, o único imperador que conseguiu enganá-lo foi exatamente D. João VI, monarca português que realizou uma das bem elaboradas operações de guerra de todos os tempos: a vinda da família real para o Brasil. Apesar da contribuição positiva dos portugueses, eles também deixaram uma herança que nós precisamos até hoje combater: o complexo de colônia, ou seja, aquela ideia de que bom é o que vem de fora, associada a ideia de que devemos esperar sempre por um “salvador’ que resolva nossos problemas, quando nós mesmos é que deveríamos procurar resolvê-los.
Em síntese, podemos afirmar que tudo de bom que a nossa cultura tem veio das contribuições dessas três etnias: dos índios herdamos o ideal de liberdade, dos negros a alegria e dos brancos a língua portuguesa. Liberdade, alegria e a quinta língua mais falada do mundo: isso é Brasil e esse é o povo brasileiro.

*Professor da Faculdade do Vale do Jaguaribe – FVJ, Especialista em Língua Portuguesa, Leitura e Produção de Textos e Especialista em Metodologia e Docência do Ensino Superior.

domingo, 7 de novembro de 2010

TUDO JUNTO E MISTURADO: A transmissão da Variedade Significativa e a Eficiência da Comunicação humana

Francisco Canindé Tinoco de Luna*


A comunicação humana, feita por meio da linguagem, nada mais é do que a transmissão de significados. O homem, observando o mundo a sua volta, percebe e capta milhares de informações e sentimentos. Essas informações e sentimentos viram imagens em sua mente, ou seja, viram símbolos, símbolos que, logo a seguir, ganham valor e se transformam em significados. Esses significados são vitais para a sobrevivência e o progresso humano, pois, tratam de avisar perigos, apontar vantagens, informar sobre uma descoberta, passar o conhecimento a frente e etc.
Acontece que o homem percebe e sente a cada instante novas informações e sentimentos e é isto que faz com que, ao longo de sua trajetória de vida, o ser humano produza uma quantidade infinita de significados, ou melhor, produza uma grandiosa variedade significativa. Surge aí um problema: Como é que o homem vai conseguir passar para o outros, com eficiência, essa quantidade infinita de significados que ele produz ao longo de sua existência? Em outras palavras, como é que o homem consegue obter eficiência comunicativa?
Para responder a essa pergunta vamos descrever um pouco acerca da história da transmissão da variedade comunicativa. Dizem os estudiosos que os animais também conseguem transmitir significados, ou seja, de certo, eles também conseguem se comunicar. Os peixes conseguiriam transmitir até dez significados, enquanto algumas espécies de macacos até quarenta sinais. São sons e posturas corporais que os animais transmitem uns aos outros para comunicar alguma coisa: a aproximação de um predador, a existência ou falta de comida, a sexualidade e etc. No fundo, esse comportamento, seria muito mais instintos de sobrevivência do que propriamente uma comunicação; de qualquer modo, é inegável que se trata de uma forma incipiente de transmissão de variedade significativa.
O homem, lá nos seus primórdios, não era muito diferente dos outros animais. Acredita-se que, antes de criar a linguagem verbal, os humanos conseguiam transmitir cerca de 100 a 150 sinais, o que tornaria a comunicação humana absolutamente impossível, haja vista a quantidade infinita de significados que produz ao observar a natureza a sua volta. Para resolver esse problema, o homem, depois de muito esforço e de muitos séculos, ou quem sabe milênios, criou um instrumento potente para transmitir com eficiência a variedade significativa, ou seja, para se comunicar com eficiência: esse instrumento potente é conhecido como linguagem verbal humana.
O percurso do homem primitivo até a invenção da linguagem verbal foi mais ou menos assim: O ser humano primitivo, lá nas cavernas, agiu sobre a natureza criando a cultura e o trabalho; ao trabalhar e transformar a natureza o homem se sentiu um ser produtivo; ao produzir se viu diferente dos demais entes da natureza e tomou consciência de si próprio; tomando consciência se viu na tríade existencial do “eu, aqui, agora”, passando a ter noção de individualidade,de tempo e de espaço; questionando-se acerca do “eu, aqui, agora”, o homem começou a simbolizar mentalmente o que via e iniciou um processo de comunicação consigo mesmo, o que chamamos de comunicação intra-humana; essa comunicação intra-humana veio junta com o desejo e a necessidade de passar a frente esses significados; surge assim o desejo de falar e para falar comunicando com eficiência o símbolos que estavam em sua mente o homem criou a linguagem verbal.
Mas a linguagem verbal já nasceu com um problema: como é que milhões de significados que são produzidos pelo homem no seu contato com o mundo seriam transmitidos de modo eficiente pela linguagem que, como sabemos, é composta por um número pequeno e limitado de sinais e fonemas? A linguagem é um instrumento, mas, todo instrumento para funcionar precisa de um dispositivo. Por exemplo, um carro é um instrumento que para funcionar precisa de chave de ignição. Qual foi, então, a chave de ignição da linguagem verbal? A resposta é: a chave que aciona a linguagem é um dispositivo que, incrivelmente, aparece em todas as línguas naturais e chama-se dupla articulação da linguagem. Mas a dupla articulação da linguagem é tema para outra aula. Vamos parar por aqui; não há necessidade de “sofrer” por antecipação.


*Professor da Faculdade do Vale do Jaguaribe – FVJ, Especialista em Língua Portuguesa Leitura e Produção de Textos e Especialista em Metodologia e Docência do Ensino Superior