A busca da Ciência por este velho “senhor” das mil faces
Por mais paradoxal que possa parecer, a SEMÂNTICA é o mais novo campo de estudo de estudo da Lingüística e, ao mesmo tempo, a preocupação mais antiga da investigação sobre linguagem. Na verdade, desde o século V antes de Cristo, portanto há 2.500 anos lá na Grécia antiga, os filósofos já procuravam explicar a origem e a natureza da linguagem, bem como a relação entre as palavras e as coisas que elas nomeavam ou significavam. Porém, enquanto a morfologia, a sintaxe e a fonologia, foram muito bem desenvolvidas pelo estruturalismo e pelo gerativismo, o estudo do significado em torno do que hoje se chama Semântica, só começou a ser sistematizado enquanto disciplina nas últimas décadas.
Desse paradoxo podemos extrair duas lições: a primeira é que, se a investigação sobre o significado remonta milênios é porque essa área de estudo é que é realmente importante e que deve desempenhar papel central no estudo sobre o fenômeno da linguagem. Depois, se a tentativa de transformar a Semântica em ciência é coisa recente, isso se deve ao fato da grande dificuldade que sempre se teve em definir o que é significado. Os teóricos, até bem pouco tempo, sempre fugiam dessa questão e, enquanto esperavam que outros ramos do conhecimento como a filosofia, a psicologia e a antropologia, explicassem nuances até então não investigadas no campo do saber, a semântica ia sendo marginalizada e “empurrada para frente com a barriga”.
Para apreender o significado, esse fugaz objeto de estudo da Semântica, um caminho a ser trilhado pode ser o das múltiplas inteligências de que o homem dispõe segundo nos informou recentemente a psicologia cognitiva. A saber: inteligência lingüística para lidar bem com as palavras; a lógico-matemática para a habilidade do cálculo; a musical para se expressar por meio de rítimos e sons; a pictórico-espacial para se projetar mentalmente no espaço e esquematizar arquétipos; a cinético-corporal para expressar sentimento por meio do corpo; a interpessoal para um bom relacionamento social; a intrapessoal para conviver bem com os problemas internos e para auto-aceitação; a emocional numa somatória das duas últimas; e a espiritual ligada à defesa de causas nobres.
Mesmo acionando esse arsenal de inteligências, o significado continua escorregadio, difícil de ser entendido. Trata-se de um amálgama, um corpo sem rosto, ou de um ser de muitos disfarces. Em alguns momentos, o significado serve à Psicologia quando ajuda a entender como funciona a mente humana e como se adquire o conhecimento. Noutra ocasião está na Filosofia procurando mostrar como o ser humano constrói suas idéias acerca do mundo e como essas idéias se estruturam de modo aceitável. Depois aparece na Lógica querendo explicar a verdade para saber se ela está no mundo ou se nós a construímos. Como não poderia deixar de ser, e aqui está o nosso interesse maior, o significado também pasta livremente pelos campos da Lingüística e, nessa área em particular, busca entender como o homem elabora seu pensamento simbólico e como se processa o fluxo intersubjetivo de significados, responsável em última instância pela construção da cultura humana.
Para termos uma idéia da importância e da complexidade do que seja significado, nessa busca pelo sentido da vida e pela verdade dos fatos, atentemos para duas matérias publicadas na imprensa nos últimos tempos: uma, de 24/11/2004, no Diário do Nordeste, mostra a hipótese levantada por dois prestigiados cientistas ingleses, na qual a terra e toda humanidade poderia ser apenas uma realidade virtual como no filme Matrix; uma civilização superior teria nos criado para fazer testes. A outra, na revista Época do dia 06/08/2007 que, falando das últimas pesquisas sobre Sinestesia, distúrbio da troca de sentidos que em grau maior ou menor quase todos temos (um gosto parecer um cheiro, um som parecer uma cor, etc), levanta a hipótese de que os conceitos que carregamos em nossa cabeça, influenciam o modo como vemos o mundo e vice-versa.
Nesse texto introdutório sobre Semântica, buscamos atiçar a curiosidade dos alunos, preparando-os para a disciplina que ministraremos neste VI período de Letras da FVJ. Mostramos que a Semântica, como nos diz Duarte (2001) se “constitui num dos domínios mais fascinantes da linguagem, cuja essência pressupõe a troca de conteúdos simbólicos que permitem a transmissão da cultura entre os homens”.
Na busca do significado de significado, certamente, parafraseando Shakespeare, “há muito mais do que nossa vã filosofia”. Este velho “senhor das mil faces”, objeto de estudo da Semântica, em última instância é quem inventa o mundo em que vivemos.
* Especialista em Língua Portuguesa, Leitura e Produção de Texto; Especializando em Metodologia e Docência do Ensino Superior; Professor de Produção Textual, Lingüística Textual, Literatura Cearense e Semântica da Faculdade do Vale do Jaguaribe – FVJ.
REFERÊNCIAS
BORBA, F. da S. Introdução aos estudos lingüísticos. 9. ed. Campinas: Pontes, 1991.
DUARTE, M. H. Iniciação à Semântica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1988.
KOCH, I. G. V. A inter-ação pela linguagem. São Paulo: Contexto, 1992
Parabéns pela matéria. Excelente comentário e tema instigante.
ResponderExcluirObrigada! Me ajudou muito em minha pesquisa